domingo, 26 de julho de 2015

Plot Twist: Enganar e Cativar

 Eu sou seu pai.

O texto contém grandes spoilers. No entanto, eles estão marcados em branco. Para lê-los, basta selecioná-los com o mouse. Só sugiro que faça, caso já tenha lido o livro/assistido ao filme.

"Plot Twist" (plot = enredo/twist = torcido), traduzido literalmente como reviravolta, é um elemento narrativo usado para surpreender os leitores/expectadores.
A wikipedia define Plot Twist como: "[...] uma mudança radical na direção esperada ou prevista da narrativa de um romance, filme, série de televisão, quadrinho, jogo eletrônico ou outra obra narrativa. É uma prática muito usada para manter o interesse do público na obra, para normalmente surpreencê-los com uma revelação."

"Mas como eu uso o Plot Twist em meu texto? Só há uma maneira?"

Claro que não.

Existem vários métodos de introduzir um Plot Twist em uma narrativa. Por falta de didática melhor, acredito que a melhor forma de explicar as diversas formas seja enchendo esse post com inúmeros exemplos. Eles obviamente virão acompanhados de spoiler, a fim de ilustrar da melhor forma possível.

Então peço desculpas desde já, e aviso que os spoilers estarão invisíveis (para ler o spoiler, basta selecionar o texto entre aspas com o mouse).

1) Plor Twist ao fim da narrativa

O tipo de reviravolta que todos conhecem. Nesses casos, o grande clímax da história está justamente em um grande fato ou acontecimento. Ele determinará o fim da história, e é por meio desse grande final que conhecemos obra que ficaram eternizadas.

~Spolers - Clube da Luta (filme de David Fincher)~

"Quem já assistiu sabe que no fim da história descobrimos que o Tyler na verdade era uma projeção do próprio ack, devido suas noites insones e problemas psicológicos.
Mas, o Plot Twist da história se revela apenas ao fim, quando Jack passa a rever todos os acontecimento pela sua ótica, e se vê segurando a arma que Tyler apontava para ele. Naquele momento, é tarde demais para conter o grande plano de Tyler, que acaba ocorrendo. Mas fica subentendido que o romance entre Jack e Marla foi levado a frente - isso é, se ele não foi preso e sobreviveu."

Sendo assim, podemos dizer que a marca registrada desse tipo de elemento narrativo, quando executado da forma acima citada, é a surpresa que só afeta aquele pequeno período de tempo. Nós não veremos o que irá acontecer depois, porque o depois não importa. O choque imediato é suficiente para que qualquer dúvida se torne algo de segundo plano.

2) Plot Twist no início/meio da narrativa

Estamos acostumados a ver reviravoltas acontecerem no final, mas esse tipo de Plot Twist muito me interessa por sua peculiaridade. Diferentemente do que se espera, a história é narrada bem até determinado ponto e depois ainda tem que lidar com os resultados - imediatos e a longo prazo - de sua mudança.

~Spoiler - A favorita (novela de João Emanuel Carneiro)

"Aqui temos duas protagonistas: Flora e Donatella. Por mais de dois meses de novela (exatamente 59 capítulos), o público foi induzido a pensar que Donatella tinha cometido um crime e estava pagando por seus pecados na cadeia. Mas no capítulo 60, eis que surge a magia do twist.
Foi na verdade Flora quem cometeu o crime, e a missão de Donatella passa a ser desmascarar a vilã e reconquistar sua filha, que acabou ficando sob a tutela de Flora enquanto Donatella esteve na cadeia."

O mais legal nesse tipo de reviravolta, é que ainda temos mais da metade dos acontecimentos pela frente. Sendo assim, o autor praticamente desenvolve duas tramas. Além do mais, Plot Twist aqui não serve para dar fim a uma sucessão de fatos, mas para desencadear uma série de novos problemas que deverão ser solucionados até o fim da jornada.
Ou seja, usar a ferramenta do Plot Twist no meio da história é mais para "animar" o público, dando a eles a sensação que a história não é previsível e que muita coisa ainda pode acontecer dali pra frente.


Ainda existem algumas subclasses para os twits:

A) Cronologia reversa: a história, nesses casos, começa justamente pelo seu final. Sendo assim a curiosidade é plantada no "como" a situação prosseguiu até que se chegasse a esse ponto e não no "porquê".

Ex: "Em "Memórias póstumas de Brás Cubas" temos o narrador protagonista contando sua história até que chegasse a morte. Mas ele avisa o leitor logo no início que ele já estava morto."

B) Red herring (ou "distração): usado principalmente em romances policiais, é a reviravolta que pega a todos desprevinidos, pois planta pistas falsas ou oculta informações primordiais para a solução do mistério.

Ex: "Em "Os Outros", vemos uma mãe desesperada com a casa cheia de fantasmas. Durante todo o filme tentamos entender de onde vêm os espíritos e o que fazer para afastá-los. Até que para surpresa geral, na verdade a Nicole Kidman, seus filhos e empregados que estavam mortos. Chocante."

C) Flashbacks: esses aqui são mais do que conhecidos. Usado por 9 em cada 10 ficwriters (e aqueles que nunca usaram, ainda vão), são a melhor forma de justificar uma personagem. Trazendo o que já sabemos de flashbacks para a mecânica do Plot Twist, nesses casos, apenas uma cena do passado é suficiente para mudar todo o enredo futuro.

Ex: "Em "Titanic", o objetivo principal do filme é achar o maldito diamante que todos achavam que tinha se perdido para sempre na imensidão azul. Claro que tudo foi esquecido a partir da primeira cena de Jack e Rose. Até que já estamos nos anos 90 e, de repente, somos transportados de volta a 1912, onde vemos Rose mexer em seu bolso e achar o diamante. Uma cena tão sutil que mudou o rumo da história (para os telespectadores, é claro, já que não faz muita diferença para aquele cara que gastou milhões procurando uma pedra para desistir quando ela finalmente foi lançada ao mar)."

D) Narrador não-confiável: ele está narrando a história em primeira pessoa, então é a única fonte de informação do público. O choque da reviravolta aqui é salientado pelo narrador se dar muito bem/muito mal, mesmo não merecendo. Afinal de contas, ele manipulou toda história a seu favor, deixando difícil para os leitores decidirem o que realmente acham de sua índole.

Ex: "Em "Dom Casmurro", deveríamos ler apenas uma história cotidiana de romance, que virou uma tragédia devido à "infidelidade" de Capituu. Contudo, o narrador da história é o próprio Bento, e nunca ficamos sabendo se ele estava mentindo ou não"

E) Chekhov's gun: é um princípio narrativo que diz que tudo que é colocado em uma narrativa tem um propósito. Em meio a um Plot Twist, o chekhov's gun pode ser qualquer elemento (desde uma personagem até um objeto), que iá ser relevante para o clímax da história.

Ex: "No filme "Um porto seguro" temos a personagem Jo, que se torna amiga de Erin. As duas ficam cada vez mais próximas, e Jo passa a dar várias dicas de relacionamento para que Erin perca seu medo e Alex e ela sejam felizes juntos. No fim descobrimos que Jo é a falecida esposa de Alex, que tirou férias do céu e permaneceu por ali só para ter certeza de que seu amado e filhos teriam um bom futuro."

*(não li o livro, então não posso dizer se a narrativa se repete)

F) Descoberta: a última e não menos importante subcategoria do Plot Twist é a descoberta (ou anagnórise). Nesse caso, a personagem faz uma descoberta sobre si (ou de outro personagem) que muda o rumo da narrativa.

Ex: "Em "O sexto sentido" Bruce Willis está morto. O filme inteiro. O que difere, no entanto, com o Plot Twist Red Herring demonstrado em "Os outros" é o fato de que a narrativa girava em torno do menino, Cole. Então a descoberta nos faz ver que o protagonista nunca foi Cole, e sim Malcolm (por protagonista, falo daquele que precisava "fechar" um ciclo). Claro que temos algumas dinâmicas Red Herring (de deixar pistas soltas que indicavam a morte do psicólogo), mas o choque nesse caso é justamente a mudança súbita da natureza do protagonista."


Ótimo, agora eu tenho muitas referências. Mas como eu utilizo essas dinâmicas no meu texto?

Não existe uma fórmula mágica que faça Plot Twists funcionarem. O grande segredo para uma reviravolta ser bem executada, é ela ter coerência e casar com o texto.
Com isso quero dizer: não force a barra para usar um Plot Twist. Criar uma história mirabolante só para inserir uma ideia que cause choque no leitor não é uma boa ideia.
Além do mais, fazer de Plot Twist uma assinatura sua pode tornar-se, por incrível que pareça, previsível demais.
Um exemplo simples que nem chega a ser um spoiler: George R. R. Martin adora matar suas personagens. O primeiro "protagonista" que morreu causou um tremendo choque e comoção. Mas agora, mesmo ferindo sentimentos alheios, as mortes são apenas o caminho necessário para o decorrer da narrativa. Ou motivo para piada no Facebook. De qualquer forma, aquele choque que sentíamos dos primeiro livros/temporadas de Game os Thrones, agora já passou.
Temos também o diretor de cinema Shyamalan. Depois de "O sexto sentido", vimos "Sinais" e "A vila" serem vendidos como filmes de finais surpreendentes. Mas basta perceber como ambos não geram polêmica pelos seus finais para saber que eles talvez não tenham surpreendido tanto assim.

Conclusão

Reviravolta é um elemento que pode lançar sua narrativa para o sucesso. Tendo um bom enredo e um final surpreendente, é quase impossível a história não receber comentários positivos.
O problema é que a única forma de saber o que funciona e o que não funciona é testando.

Espero então que toda a informação acima auxilie vocês na hora de escolher o tipo de Plot Twist que mais se encaixa com sua história.
Isso é tudo.
Até o próximo post.
Beijos da Ana.

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